Uma colina para a minha esperança

Esta é a colina desenhada para repousar a cabeça, ouvir a relva a crescer, sentir o afã do caracol que lambe o chão que passeia o seu corpo, lânguido e húmido. Esta é a hora que precede o nascer do sol, as cores que rasgam o céu num lusco-fusco que acorda o mundo pequenino, de todos os que anseiam o que vai nascer. Este é o leito do rio onde sacio a minha sede de viver, bebendo aos supetões, num fôlego de água que escorre para o sulco dos meus seios, prenhes de desejo. Este é o regaço de árvore velha, que acolhe os meus lábios, anéis de desvelo desenhados na madeira mais dura, da tenacidade de quem soube esperar, sob ventos e tempestades. Este é o momento em que, ao invés de proclamar ao alto a minha intensa felicidade, sento-me no lugar mais afastado do mundo, aqui dentro, no fundo do mar ou no centro do furacão. E contemplo devagar, como se desembrulhasse uma noz, camada por camada, página a página, segundo a segundo. E quero aprisionar-me neste momento de perfeição… da felicidade arrancada à mais intensa dor. E agradeço, cada uma das estrelas deste imenso céu, uma e outra vez, agradeço esta luz emprestada ao meu ser, e que agora brilha em tudo, através de tudo.

Este é o tempo de ser feliz de mansinho. A hora do lobo dormir. Esta é a colina onde repouso a minha esperança.