À beira do mar, o mundo era nosso. E eram nossas as ondas e a espuma a lamber-nos os pés. Cada grão de areia escorregava no nosso suor, dos dedos até ao chão. E a descoberta de não estarmos sós, nunca mais, desprendia-se do nosso fôlego, ressoando pele a pele. Eram nossas as árvores altas, quietas na sua imensidão, reverenciando as folhas longas ao vento. Eram nossas as mãos dadas, ou não seriam? Não eram, agarravam um mundo a nascer, uma mala de desejos sussurrados ao universo.
Era nossa a alegria, calada. Secretos nomes que chamávamos um ao outro, apelidando os sonhos como queríamos, sem método nem gramática. Sem medir nada, sem guardar nada, apenas a sentir. E o mundo era nosso. Como hoje o é dos nossos sonhos e desejos, que secretamente enchem o berço do mundo.
As borboletas, nossas, esvoaçavam na barriga, vivas, não metafóricas. E engolíamos tanto ar, a rir, para que pudessem voar mais alto.
E esperavamos, juntos, que o mundo eclodisse de novo, num fogo-de-artíficio ancestral.
Está quase. E só este sentir é nosso. Nem o tempo, nem o espaço, só o sentir, grande e profundo. É nosso. E não desaparecerá nunca.