Asas de papel porque nada é tão frágil como o ser que começa. Qualquer começo é frágil, porque é fácil ceifar a vida que ainda mal respirou. Às vezes apetece voltar aos começos e reescrever tudo. Olhar em volta e antecipar as coisas inomináveis que aí vêm. E dizer:
– Vais dizer coisas sem remédio. Vais magoar os que amas. Vais sofrer de formas que sonhaste serem impossíveis.
Mas nada digo, mesmo neste começo. Sei que vou errar. Sei que estou a errar, neste momento, em que antecipo o que ainda não vivi. Sei que vou sofrer e, pior, vou fazer sofrer. Mas tenho o encanto do que é pequenino, o que alimenta em si a semente de poder ser grande, em tudo e em todos. Eu quero viver, mesmo que saiba que vai doer. Queremos viver, mesmo com a tristeza de tudo o que não foi e sonhámos um dia ser.
Asas de papel que estendo timidamente ao sol e ainda à chuva.
Recomeça, então. Uma e outra vez. Não lamentes o que passou. Rega bem esta de semente do agora. E acalenta esta força do que nasceu hoje. Nada é tão pleno de esperança como o que ainda não aconteceu. As posssibilidades são infinitas.
Vou contar a história destas asas de papel, cada pequeno rasgão, cada borrão de tinta. Às vezes vou mostrar como elas brilharam ao sol e enfrentaram tornados. Vamos contar esta história juntos. Alguns vivem para contá-la. Eu conto-a para continuar a viver, e a voar.