Palavras imperfeitas I

Olho estes momentos que passaram, fui feliz.
E houve segundos em que um deus menor sorriu no céu,
E em que um relâmpago abriu os mares. E eu fui redonda e inteira,
Toda eu, ali, nua e exposta, à intempérie dos sentidos.

E tudo o que dói hoje é este ser que fui, e que dei e derramei,
Para lá deste cálice vermelho, com o meu sangue,
A pulsar ensurdecedor em todos lugares da Terra
Desta terra feita do meu corpo, em que nada nasceu.

E agora esta dor, a trabalhar a engrenagem da cabeça
Sem coração, reduzido a ruído de fundo, calado
Mudo, como são todas coisas que sofrem e
Em silêncio, permitem viver.

Não sei para quando o acordar. E se alguma vez voltar…
A cantar com o coração empalado,
Talvez não haja retorno,
E assim possa, finalmente, descansar.

E fecha-se o palco, cai o pano.
Nenhum aplauso, nenhuma lágrima.
E sons dos passos, que seguem, adiante.
Para lá há sempre caminho. E recomeço…

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